sábado, 14 de maio de 2011

DIABETES MELLITUS I

ESTUDO DIRIGIDO - DIABETES MELLITUS - I

1 CASO CLÍNICO
Leia com atenção o caso clínico abaixo. Você já conhece o paciente. Observe que mudanças ocorreram neste período de cinco anos.
O Sr. Adauto Pressório, motorista de taxi, hoje com 50 anos, compareceu à consulta em janeiro para reavaliação dos fatores de risco para doença cardiovascular (segundo ele, para “controle da pressão”).
Ele não gosta destas consultas porque “não sente nada”. Mas nestes cinco anos passou a confiar em você e comparece regularmente nos retornos - embora não siga muito bem as suas orientações.
Neste período ganhou 5 kg e - de novo - disse que em breve terá tempo de começar os exercícios. Não vem seguindo muito bem a dieta porque almoça fora de casa; e na hora do jantar sempre chega faminto. Também pretende parar de fumar e já reduziu o consumo de álcool para apenas uma latinha de cerveja à noite. Ele tem utilizado hidroclorotiazida 25mg quase todos os dias de manhã, mas o enalapril de 20mg, que deveria ser tomado duas vezes por dia, ele só toma de manhã. Segundo ele mesmo disse “porque não estou sentindo nada e acho que o excesso de medicamentos pode fazer mal”. O ácido acetilsalicílico ele não toma pelo mesmo motivo, e porque não consegue se lembrar de tomar “mais um comprimido” na hora do almoço.
Durante o exame a pressão arterial na maioria das medidas estava por volta de 135/85 mm Hg. O exame físico nada revelou além da obesidade (peso=100 kg; altura 1.70; IMC=34,6). A freqüência cardíaca era 70 bpm.

Os novos exames complementares de janeiro são apresentados no quadro:
Glicemia de jejum 160 mg/dl (até 126)
Glicohemoglobina 8,5% (até7%)
Colesterol Total: 220 mg/dl; LDL 140 mg/dl (até 100); HDL: 30 mg/dl (maior do que 40);
Triglicérides 300 mg/dl (até 150)
Potássio Dentro dos valores de referência
TSH basal Dentro dos valores de referência
Creatinina, uréia. Dentro dos valores de referência
Microalbuminúria 40 mg/g (até 26)
Urina rotina Dentro dos valores de referência
Ácido úrico 12 mg/dl (Homem: 3,4 - 7,0 mg/dL)
Eletrocardiograma Sobrecarga ventricular esquerda
Ecocardiograma Hipertrofia ventricular esquerda
Teste ergométrico Ainda não conseguiu fazer.

Ele repetiu a glicemia de jejum em uma semana e você confirmou o diagnóstico de diabetes. Faça uma lista com todos os problemas do Sr. Adauto que você identificou. Marque aqueles que deverão interferir na sua avaliação e abordagem do diabetes.
-Má adesão ao tratamento farmacológico proposto (hidroclorotiazida 25mg quase todos os dias; enalapril de 20mg, deveria ser tomado duas vezes por dia, só toma de manhã; Acido acetilsalicílico não toma)
-Persistência de hábitos inadequados de vida (dieta, atividade física, tabagismo)
-Obesidade (peso=100 kg; altura 1.70; IMC=34,6) e Ganho ponderal( 5 kg)
-Dislipidemia (LDL e Triglicerídeos elevados, HDL baixo)
-Diabetes Melitus 2
-Microalbuminúria
-Síndrome metabólica
-Sobrecarga e hipertrofia ventricular esquerda
-Uricemia

2 ANÁLISE DO TEXTO
1) Assim que confirmou o diagnóstico de diabetes Sr. Adauto você começou a pensar se deveria instituir o tratamento farmacológico de imediato. Cite razões para começar agora, e razões para adiar algumas semanas ou meses.
Começar agora: o paciente apresenta glicemia de jejum alterada somada a níveis elevados hemoglobina glicada o que indica níveis altos de hiperglicemia (>200) nos últimos 2-3 meses; alto risco cardiovascular; tabagismo; exame sugestivo de insuficiência renal inicial (microalbuminúria elevada); resistência a mudar hábitos de vida; para pacientes nunca tratados é recomendado pela SBD início do tratamento medicamentoso aliado a mudanças de estilo de vida.
Adiar: Emagrecimento, dieta adequada e realização de atividades físicas poderiam reduzir expressivamente os níveis glicêmicos do paciente.

2) Qual será a meta (níveis glicêmicos e de glicohemoglobina a alcançar) do tratamento, seja ele farmacológico ou não? Justifique.
Glicemia de jejum e pré-prandial < 110mg/dL; Glicemia pós-prandial < 140mg/dL; A1C< 6,5%(SBD). A glicemia é uma variável contínua de risco, portanto o tratamento ideal deve ter como meta os níveis glicêmicos normais sem que para tanto haja risco inaceitavelmente aumentado de hipoglicemia.

3) Como você explicará ao Sr. Adauto – agora, ou mais tarde - que, embora ele “não sinta nada”, será necessário acrescentar mais uma droga à sua prescrição? Use argumentos objetivos.
O diabetes é uma doença silenciosa que raramente causa sintomas, porém as consequências de seu descontrole são drásticas e somente ocorrem após anos de não tratamento. O diabetes apresenta risco de morte cardiovascular equivalente às pessoas que já tiveram IAM, é a principal causa de cegueira não congênita e de amputação não traumática, junto com HAS é a principal causa de IRC, além de causar outros danos como impotência sexual.

4) Dentre as quatro fases do Diabetes mellitus mencionadas no texto (insulinorresistência, etc.), em qual o Sr. Adauto provavelmente se encontra? Justifique, citando evidências clínicas e laboratoriais.
Fase 1. O paciente apresenta Síndrome Metabólica a qual indica resistência aumentada à insulina: Obesidade - IMC > 30 (34); Trigliceridemia > 150 (300mg/dL); baixo HDL < 35 (30mg/dL); Hipertensão arterial (HA); DM 2. Além disso apresentou ganho de peso desde a última consulta.

5) Há uma droga excelente para iniciar o tratamento. Se você tiver dúvidas, confira as respostas das perguntas acima. Veja se ele tem alguma contra-indicação a esta droga. Se não tiver, faça a prescrição completa. Comece com uma dose baixa e aumente a dose a cada duas semanas, até a dose máxima.
USO ORAL
-Prescrição: Metformina, 500mg, 14 comprimidos. Tomar 1 comprimido após o jantar, diariamente.
-Ajuste 1: Metformina, 500mg, 28 comprimidos. Tomar 1 comprimido após o café da manhã e 1 após o jantar, diariamente.
-Ajuste 2: Metformina, 500mg, 42 comprimidos. Tomar 2 comprimidos após o café da manhã e 1 após o jantar, diariamente.
-Ajuste 3: Metformina, 1000mg, 28 comprimidos. Tomar 1 comprimido após o café da manhã e 1 após o jantar, diariamente.
-Ajuste 4: Metformina, 850mg, 42 comprimidos. Tomar 2 comprimidos após o café da manhã e 1 após o jantar, diariamente.
(OBS: Contra-indicações: gravidez, insuficiências renal (creatinina > 1,5), hepática, cardíaca, pulmonar e acidose grave)

Depois de “sumir” por vários meses, o Sr. Adauto retornou em agosto trazendo os exames que em janeiro você pediu a ele que fizesse, mas que ele só conseguiu fazer nesta semana. Embora persista assintomático e com o mesmo estilo de vida, ele perdeu 3 kg neste período. Ele disse que não tolerou a dose máxima da droga que você prescreveu por causa dos efeitos adversos, mas tem tomado uma dose média (entre a dose inicial e a máxima que você prescreveu).
Veja no quadro o resultado dos exames que ele fez em agosto.
Glicemia de jejum 150 mg/dl
Glicohemoglobina 7,5%
Colesterol Total: 210 mg/dl; LDL 140 mg/dl; HDL: 30 mg/dl;
Triglicérides 200 mg/dl
Potássio Dentro dos valores de referência
TSH basal Dentro dos valores de referência
Creatinina, uréia. Dentro dos valores de referência
Microalbuminúria 60 mg/g
Urina rotina Dentro dos valores de referência
Vitamina B12 Dentro dos valores de referência
Ácido úrico 10 mg/dl

6) Quais são os efeitos adversos aos quais ele se refere? Qual a razão da perda de peso?
Desconforto abdominal, náuseas (15%), diarréia (20%). Uma vez que o paciente não mudou seus hábitos de vida, provavelmente ocorreu devido ao efeito da própria droga. Outra possibilidade é o início de falência das células beta.

7) Você acha que a droga que você prescreveu cumpriu seu papel? Justifique.
Apenas parcialmente. Houve melhora discreta (triglicerídeos) do perfil lipídico e da glicemia, contudo a glicohemoglobina e a glicemia de jejum ainda estão acima dos níveis desejáveis para o paciente (6,5%, 110mg/dL)

Ele “já avisou” que não vai utilizar insulina “nem que a vaca tussa”.
Portanto, agora você tem três opções:
1. Manter as drogas e estimular as modificações do estilo de vida;
2. Aumentar a dose da droga que ele está usando;
3. Associar outra droga via oral.

8) Decida qual será sua conduta e justifique.
Associar sulfoniluréia. É a única outra opção considerada bem validada, além da associação com insulina (de acordo com algoritmo da ADA, 2009).

9) Se você decidiu associar outra droga, faça a prescrição de uma dose inicial, e já programe como será o primeiro aumento de dose.
Uso oral
Glimepirida, 1mg, 14 comprimidos. Tomar 1 comprimido junto com o café da manhã.
Ajuste 1: 2mg, 14 comprimidos. Tomar 1 comprimido junto com o café da manhã.

10) Considere o mecanismo de ação do medicamento que você prescreveu. Que tipo de orientações você deve dar ao Sr. Adauto sobre dois importantes efeitos adversos?
Hipoglicemia: explicar sobre a importância de reconhecer e impedir a sua progressão precocemente. Cefaléia, mal estar, crise de fome, sudorese fria inexplicada, tonteiras, náuseas, vômito, cansaço, taquicardia. Grave: síncope, convulsão, coma. Orientar ainda sobre os fatores que aumentam esse risco: jejum/baixa ingestão calórica, consumo de álcool, exercício físico intenso.
Ganho de peso esperado de cerca de 2 kg.


Tratamento da hiperglicemia pós-prandial.
Atenção: aqui vale a mesma regra. Por questões relacionadas à eficácia, segurança e custo dos medicamentos, nesta parte você também só poderá prescrever biguanidas, sulfoniluréias e/ou insulina para o Sr. Adauto.
Imagine que na consulta de agosto o Sr. Adauto trouxe os resultados do quadro abaixo, e não aqueles do quadro anterior. Veja as diferenças. Analise o que deve estar ocorrendo com ele, do ponto de vista do metabolismo de carboidratos.

Glicemia de jejum 120 mg/dl
Glicohemoglobina 8,0%

11) Sua prescrição agora seria diferente? Justifique.
Não. (idealmente prescreveria metiglinidas)

12) Se for diferente, faça a prescrição de uma dose média deste medicamento.

13) Explique para o Sr. Adauto as diferenças entre a repaglinida e sulfoniluréias com relação ao horário de administração e à intensidade dos efeitos adversos.
A repaglinida tem ação curta (tempo de meia vida de 1h) devendo ser administrada cerca de 30 minutos antes das principais refeições (café da manhã, almoço, jantar). A repaglinida apresenta menor risco de hipoglicemia e ganho de peso, comparada às sulfoniluréias.
As sulfoniluréias têm duração mais prolongada e devem ser administradas 1 vez ao dia, pela manhã, junto com a primeira refeição significativa.

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